The Verve - Forth
Estou
conectado há mais de uma hora, apertando teclas aleatoriamente, estou cansado e
o sono me persegue outra vez, pensei em dar uma volta, dar uma arejada nas
ideias porém, na sala eu desisti assentando no sofá com a companhia dos meus
dois gatos. Liguei a televisão apenas para comprovar que nada na televisão me
interessa. Vou pra cozinha e preparo um café amargo, eu já acostumei com a
minha solidão, fico horas e horas sem falar com ninguém cuidando do meu pequeno jardim, podando a roseira, umedecendo as orquídeas, retirando matos que
cresceram junto aos pés das margaridas e o girassol está tão bonito.
Mas,
somente quando chega à noite e a insônia rotineira se apresenta e possessa do meu
quarto eu apago a luz e no escuro algumas ideias brilhantes surgem, algumas se
apagam como as estrelas e outras permanecem até chegada do sol. Vagarosamente me
arrumo para o trabalho, coloco o fone nos ouvidos o álbum "Forth” do The
Verve.
Adormeço
nos primeiros acordes da belíssima “Sit and Wonder”e, quando acordo já estou
bem perto da empresa e a música que rola é “Valium Skies”. Retiro o fone do
ouvido.
O
crachá tem um peso significante quando não fazemos o que gostamos, porém o
ônibus já está próximo e o sol já é visto pela metade atrás da montanha. O peso
do crachá parece aumentar quando aproximamos da portaria. Há um silencio
notório nos funcionários cabisbaixos, o barulho da catraca é um incomodo. A catraca
é a divisão do mundo servil com qualquer outro mundo que você viva, entretanto
este mundo servil é a engrenagem que movimenta o outro qualquer mundo que você
viva.
O amigo que te cumprimenta todos os dias com tampinhas nas costas no
vestuário é o mesmo que está querendo tua vaga de operador e o teu salário. Eu
percebi isso quando ele sorriu pra mim na segunda-feira de manhã enquanto
tomávamos café juntos. O meu crachá tornou-se ainda mais pesado depois do sorriso dele.
Saio
da fábrica exausto e apressado apenas para testemunhar o sol pela metade pois,
o mesmo já esconde-se atrás da montanha. Geralmente eu durmo no trajeto de
volta pra casa, alguém me chama:
_Acorda
já chegou. _ Levanto atabalhoado sempre derrubando alguma coisa, o paciente motorista sempre balança a cabeça rindo do meu jeito afobado ao descer os
degraus do ônibus.
Obedientemente aos meus costumes sempre paro num boteco e, com o costumeiro
pedido:
_Uma
latinha de Skol e uma dose caprichada de Jurubeba.
Se
for em dia de pagamento prolongo minhas horas naquele ambiente que sempre tem
uma bandinha de pagode ao vivo o que obriga a colocar o fone nos ouvidos e
aumentar o volume no máximo “Love Is Noise” é a música mais chapada do álbum. Fico ali num canto numa mesinha com uma única cadeira observando
jovens e suas bebidas acompanhadas com energéticos, as vezes alguns deles se
aproximam pedindo me o isqueiro para acenderem os seus baseados.
_E
ai tiozão valeu!!!
Nesses
dias levantar da mesa e chegar até o caixa é um obstáculo cuidadoso, passos curtos e
olhos focados, mesmo assim sempre encosto em alguma mesa quebrando copos e
garrafas. A palavra que eu ouço repetidas vezes é “bêbado”. Confiro o troco
religiosamente contando e recontado dezenas de moedas que o dono do estabelecimento
faz questão de empurra-las para mim afim de me sacanear. Na terceira tentativa
desisto de contá-las e, enfiou tudo dentro do bolso.
Não
sei exatamente que horas são porém, sei exatamente onde meus passos
ziguezagueando me levarão. Luzes de neon vermelhas que piscam a palavra Sex. Luzes
azuis, verdes e amarelas que piscam outras palavras que não me recordo agora.
Na bilheteria ou entrada uma moça com decote V com os bicos dos seus
peitos quase de fora, cobra minha entrada então, eu enfio a mão no bolso e empurro aquelas dezenas de moedas.
_Confere
ai, o que estiver faltando eu pago em cédulas.
A
moça olha estranho na minha direção enquanto eu olho para o bico do seio
direito que escapuliu do seu decote, ficaria ali com olhos solícitos nos
próximos dez minutos se ela não intrometesse repetidas vezes:
_Vinte
cinco reais e quarenta e cinco centavos.
_Oi???
_Moço...
Pela quarta vez, vinte cinco reais e quarenta cinco centavos.
_É
que o seu seio direito com bico arroxado está de fora.
_Nossa
moço!!! Desculpa que vergonha.
Que
vergonha, a vadia nem se lembra que no meu último pagamento era eu que estava
mamando em seus peitos.
Sinto
me culpado por adentrar nesse pequeno corredor que me leva a um pequeno palco
rodeados de homens a maioria deles casados, sedentos e tarados por Strip-tease.
Novinhas rebolando nuas pra arrecadarem dinheiro para parcelas da faculdade ou
tentando ganhar dinheiro para a próxima carreira de cocaína. Eu com o copo na
mão de uísque com gelo pago pelo o “zóio da cara” estou de olho em uma loirinha
que parece tímida, uma dessas que tenta pagar a faculdade a qualquer custo para
manter seu sonho de ser bióloga, engenheira, advogada sei lá.
Então,
como pagante ela veio em minha direção tirou vestidinho enxadrezado e
curtíssimo, uma calcinha preta de renda e sem o sutiã, começou a dançar sem
pudor nenhum, num abaixa e levanta que muitos chegariam em orgasmo. Eu
continuei firme, confesso que sem piscar meus olhos, ela ficou nua e sem
controle, contorcendo perto de mim. Bêbado mais consciente que não poderia
toca-la que um segurança brutamonte poderia aparecer do nada e me esmurrar os
meus dentes da frente até cai-los no chão.
Paguei
um preço exuberante para tê-la no quarto comigo, ela ofegante ainda da sua
apresentação, com os cabelos desajeitados, um riso falso como a pulseira que
adornava seu braço tatuado e musculoso, um olhar sem brilho ainda que atento
e assustado, efeitos do abuso da cocaína que a coriza constante comprovava. Não
houve dialogo nos minutos subsequentes, duas almas vazias e perdedoras provando
do sexo o pior que ele pode oferecer, o encontro de duas línguas ásperas como
lixas grossas misturadas ao aroma de cigarros baratos e doses exageradas de
jurubeba. Minhas mãos calejadas em seus seios absurdamente grandes e flácidos,
o silencio só era quebrado quando chupada mal dada fazia o estalar dos lábios
ou, quando um gemido de dor ou remorso escapava ecoando pelo quarto.
No
final das contas terminamos o coito ainda mais vazio que o começo. Ela
limpando-se com o chuveirinho e eu, preocupado com a droga do crachá que caiu
debaixo da cama...
...
Voltei pra casa ouvindo na íntegra um dos álbuns mais angustiantes e belo do
mundo.