quarta-feira, 7 de dezembro de 2016

Muito Antes de Laura - Muito Antes de Laura

Muito Antes de Laura - Muito Antes de Laura

(Para o Blog Relato Estrépito continuar em 2017 terei que agregar minha outra paixão além da música, a fotografia... Relatos como este será cada vez mais constante... Abraços).


Alguém veio me visitar e deixou este álbum aqui, não sei quem? Porém, essas musicas me acompanham o dia inteiro. Entre o Relato deixarei algumas músicas que, certamente já faz parte do meu dia a dia.



Quando tento dormir sou impedido por imagens que vem a minha cabeça, imagens oriundas não sei de onde, de lugares que desconheço. Há uma garça branca no meio de um lago cheio de peixes e rodeada da solidão. Existe um biblioteca por perto mas, os garotos e as garotas nem percebem extasiados pelo efeito da fumaça que inalam: sorrisos fáceis, alegrias falsas de uma vida superficial.



Levanto e caminho pelo quarto, outros imagens deste mundo surreal vem à tona, alguns passos, me deparo com outro lago onde martim-pescadores sobrevoam, crianças atiram pipocas para os peixes coloridos. Aproximo do lago e perto da imagem de São Francisco um casal de viuvinhas preparam seu ninho numa arbusto todo florido. Não tenho certeza mas, algo me diz que eu já estive aqui antes.




Ouço um barulho no alto da palmeira, um gamba descontraído alimentando-se do fruto amarelado, fico ali observando todos os seus movimentos até surgirem as fanfarronas das maritacas. Mais alguns passos me deparo com um Rio de águas amareladas. Um arrepio percorre lentamente o meu corpo inteiro, adiante um lindo pôr do sol e ao meu redor um Rio que pede socorro.



Ouço alguém batendo na porta do quarto, é médico e suas visitas quase que diárias desde que sofri um acidente e minha memória se apagou. Pergunta como estou, e ,respondo que mais imagens deste Bosque Surreal continua aparecendo. Então pela primeira vez o médico me disse:
_Roberval este Bosque, ele existe e se chama Bosque da Princesa e, todas essas imagens que você me descreve também são suas fotografias. Você fotografou todas essas imagens que te perseguem



O médico abriu uma pasta, enfim deparei com centenas de fotos com minha assinatura, fotos que mesmo debilitado me perseguem.


quarta-feira, 2 de novembro de 2016

E Você Se Sente Numa Cela Escura, Planejando A Sua Fuga, Cavando O Chão Com As Próprias Unhas

E Você Se Sente Numa Cela Escura, Planejando A Sua Fuga, Cavando O Chão Com As Próprias Unhas

Coisas belas ditas pelo velho pároco, ao seu lado um jovem aspirante a padre dotado de um olhar misterioso, coisas da missa matutina do domingo na igreja que ficava no final das vielas, contrastava com os pecados diários que eu cometia, nem a benção do padre ou Pai Nosso valia o meu dia, nem mesmo o sol incrivelmente posicionado no meio do céu me tirava do meu esconderijo do meio do matagal. Debaixo das arvores que possuíam espinhos pontiagudos, eu e meu amigo Linari criavam ali personagens fortes e maldosos, verdadeiros super-heróis que não sentiam amor e nem piedade. Somente quando eu ouvia os gritos de mamãe me chamando o medo desvestia-me do torpor, voltar para casa e encontrar papai bêbado resmungando palavras de ordem e palavrão era um grande saco. Papai não sentia amor... Eu não sentia amor.

 No começo de uma noite fria e tenebrosa infestadas de rajadas de vento, debaixo da arvore de espinhos pontiagudos, rodeados por dezenas de vaga-lumes, no céu de algumas estrelas reluzentes que, apareciam e desapareciam entre as nuvens escuras de uma tempestade anunciada. Lembro-me do grito de mamãe diferente como se fosse trovão rasgando aquele começo de noite, não era palavras, era uivo de dor feito um animal que sente frio e fome. Nem me despedi de Linari, senti aquele grito penetrando meus ouvidos como se fosse um inseto mastigando vorazmente meus tímpanos, corri desgraçadamente derrubando todo o matagal no peito e, ao aproximar da velha casa sem reboco, eu vejo minha mãe sentada no chão, com as mãos colada no rosto chorando compulsivamente, meu pai que não sentia amor estava estirado no chão sem vida.
Foi quando um estranho que saiu não sei de onde, encostou uma arma pro meu crânio e eu, nada pude fazer a não ser me ver balbuciando febrilmente, implorando:
"Eu não estou pronto pra morrer"


Ainda persiste uma dúvida que talvez nunca vá esclarecer. Ainda persiste uma dúvida que eu não me canso de remoer, os dias subsequentes foram os mais cruéis de minha vida, a lamuria tem cor cinza e os dias impares são os piores.  A cerca de arame farpado e a falsa liberdade diante dos meus olhos murchos pela oprimida vergonha da veste e da fome.
No fim da ladeira, entre vielas tortuosas, há uma vila de casinhas silenciosas. Numa manhã fria, eu saí de uma delas passos lentos e silenciosos, sem dizer adeus e nem olhar para trás. Porém, nenhum dia se quer a vila saiu dos meus pensamentos... Em meus sonhos eu caminho por todas as vielas, conheço todos os cachorros que perambulam pelas as ruas, conheço todas as casas no entanto, nos meus sonhos eu sou um desconhecido, os cachorros avançam na minha direção e a minha mãe não me reconhece, sempre na janela com olhar triste e ao mesmo tempo vago. Sempre acordo assustados todas as vezes e, imagino aquelas vielas tortuosas como se eu nunca tivesse me ausentado dali.


Eu desconheço exemplo mais eficaz do que uma criação inadequada é capaz e, os dias cinzas e chuvosos sempre me entristece bem mais que deveria, fugas de lagrimas e a incontrolável tremedeira que nenhum agasalho consegue me aquecer. Na rua as pessoas vem e vão, hoje eu tenho essa convicção, eu poderia voltar agora mesmo no meio dessa chuva, no meio da noite entre os relâmpagos e o barulho do trovão mas, a coragem que eu tive para partir eu não tenho para voltar, mesmo que isso cause ulceras gigantes, angustias e tonturas, insisto em ficar aqui. Meu orgulho está me matando... E você se sente numa cela escura, planejando a sua fuga, cavando o chão com suas próprias unhas.




Mas, como dar amor se nunca recebeu, balbuciar palavras dóceis com os lábios ressecados e lembrar do amor escondido num lugar onde ruído se abafe... Eu não estou pronto para morrer.



TV on the radio – Nine types of light


Ela não virá, ele pressente, mas ainda espera. Ele olha repetidas vezes para o relógio, não consegue disfarçar a ansiedade e o desconforto.  O celular nunca toca nessas horas, é visível sua tristeza, no entanto, ele tenta disfarçar falando mais do que habitual, rindo mais do que deveria e bebendo apressadamente.
Ela não virá agora é uma certeza para todos, porém ele ainda insiste em olhar pra mesma direção, verificar o relógio. Ele parece não acreditar, pensa em ligar pra ela, não completa a ligação pela quinta vez. Já não ri mais como meia hora atrás, retraído quase que não fala, e pela segunda vez derrubou a bebida na mesa.
Ela não virá passa a ser uma certeza pra ele também que, quase cai ao levantar-se da cadeira, sente-se inseguro em caminhar, enxerga duas luas apoiado no tronco de uma jabuticabeira.
Diz estar bem pra todos que se aproxima, diz estar bem também quando não tem ninguém ao seu redor. Abraça forte a jabuticabeira e começa a questionar:
Por que ela não veio?
Por que?
Chora um choro sem lagrimas ainda assim um choro verdadeiro. Tira o celular do seu bolso, nenhuma ligação. Joga o celular para bem longe. Ri ainda abraçado na jabuticabeira, um riso sem graça e sem motivo. Recupera-se. Ainda há duas luas no céu e um imenso caminho até chegar ao banheiro.
Ele já está lá não e sabe como, o lavatório verde não combina com vaso branco, porém a vontade de urinar é tanta que o jato rápido e incerto molha as paredes e o chão. A descarga de cordinha é um descanso para o seu braço. Cem litros de água para 400 ml de urina. Ele não lava as mãos, o sapo não lava o pé.
Fim de festas, mesas vazias, ela não veio, e isto, foi um tiro em seu coração.
Duas luas, uma lua meia, uma lua. Isto agora não importa. Ele chutou as cadeiras e jogou a mesa para bem longe. “Foda-se todos” ele gritou.
Voltou para casa, ligou seu aparelho de som. Um micro system que ganhou daquela vadia que não compareceu na festa. Apertou o play.
Second song passou despercebida... Keep your heart acompanhou seus movimentos até geladeira, uma geladeira que mais parecia um deposito de cerveja... You... Yyooouuu, assim foi feita a escolha.
Vadia, vadia, vadia... Repetiu exaustivamente essa palavra que só “Will Do” trouxe de volta a realidade. Abriu a janela apenas uma lua, tudo começou a fazer sentido novamente.
Forgotten... Outro jato de urina agora certeiro no vaso branco que combina com lavatório. Decidiu tomar um café para curar da ressaca que começava a incomodar... Apertou o display também para certificar o que estava ouvindo... TV on the radio – Nine types of light.

Ah! Só podia!


quinta-feira, 20 de outubro de 2016

Radiohead : The King of Limbs

Radiohead : The King of Limbs

 O céu escureceu mais cedo hoje e já faz tempo que Deus não vem me visitar nem em forma de passarinho, nem em forma de flor e nem forma nenhuma. Acordei no sofá com uma ressaca gigante, tomei dois comprimidos com café frio mesmo pra ver se a dor de cabeça vai embora.
A casa está vazia, sem o barulho do Bruninho o silencio dessa casa é deprimente. Minha esposa saiu e levou com ela os nossos filhos e, cada dia que passa dá impressão que eles são mais dela do que meus. Eu não tenho nada desde do dia que eu perdi a ambição, não tenho nenhuma planilha e nem livros de auto-ajudas. Eu não leio bíblia, pois acho muito complicado parece bula de remédio. Na verdade eu odeio domingo, feriado, carnaval, Natal... Eu odeio datas comemorativas enfim, eu me odeio.
Onde estive ontem à noite... Putz, eu não sei... Eu estava com os caras da fábrica num barzinho... Depois acordei nesse sofá... Lembro-me vagamente de coroas gordas, peitudas e risadas, mas eu não sei o que é real e o que é sonho. Não sei como cheguei aqui...
Nenhum e-mail, nenhuma mensagem no Facebook, nenhuma ligação no celular. Já são 18h00min e eu, já to chapado novamente. Acho que teve jogo do Corinthians na Rede Globo, porém eu dei prioridade pro novo cd do Radiohead que eu baixei na semana passada. Bom. O cd é bom, no entanto eu prefiro ainda Kid A e o clássico deles: Ok Computer.
Tô com saudades dos moleques. Onde minha esposa levou-os? Às vezes penso que minha esposa usa meus filhos pra me ferir, mas sei lá, vai que ela quer apenas preservar os moleques da vergonha que eu me tornei.
Coroas gordas e peitudas novamente invadem meus pensamentos. Onde estive? O que fiz?
Eu poderia ficar mais tempo no barzinho com os caras da fábrica que certamente alguém me levaria embora, mas estava tão chato, tão chato...
Tenho mais três latinhas na geladeira e uma indisposição enorme pra sair de frente do computador, qualquer dia desse eu coloco esse computador dentro da geladeira apenas pra facilitar essas tarefas difíceis.
Sexta-feira eu joguei bola com o Bruninho até as 23h00min, já tinha tomado todas no Bar do Jaime, porém o Bruninho ainda não percebe isto, e, todas as vezes que passava a bola por mim e batia na parede ele gritava gol:
_Goooool do Corinthians papai:_Na verdade ele não fala Corinthians certinho, mas vou deixar assim mesmo.
Vou ter que me levantar, pois já sinto falta de outra cerveja.
Tenho a impressão que quando minha esposa voltar vai me encontrar outra vez dormindo no sofá e, certamente dirá:
_ Não acredito que essa mala ta deitado até agora.
O novo cd do Radiohead “The King of limbs” têm apenas oito musicas, as quatros primeiras em meu conceito são descartáveis “Lótus flower” a quinta musica é aonde o cd começa engrenar “Codex” é tensa e triste “Give up the Ghost” parece que vai ser chata mas, quando Thom Yorke começa a cantar a chatice vai embora rapidinho e, finalmente pra encerrar “Separator” apesar de não ser o melhor cd do Radiohead Thom Yorke ta cantando como nunca.
 Acho que vou fritar uma lingüiça e colocar no meio de pão. To com uma fome do cão. Já foi o tempo que o meu domingo rimava com Coca-Cola e macarrão. Agora rima com ressaca e solidão... HAHAHAHA...   

(Texto escrito em 26 de abril 2011)

segunda-feira, 18 de julho de 2016

Red Hot Chili Peppers - The Getaway


Red Hot Chili Peppers - The Getaway

Entre razão e o sonho Rafaela levantou-se do sofá e, diante do espelho refez a maquiagem, adorou a cor do seu cabelo, fez uma careta e disse baixinho “tenho que viver”. Ligou para sua amiga.
_Estou pronta.
Na delonga caminhou pela sala quebrou todos os cds e dvds do Red Hot Chili Peppers, alegando fazerem parte do seu passado que tanto almejava esquecer. De hoje em diante a minha trilha sonora será feita pela razão pensou alto. Ligou o aparelho de som, e, no último volume começou a requebrar feito uma doida em cima do sofá, só parou quando ouviu a buzina do carro da amiga.


 Pegou sua blusa preta, reforçou o batom vermelho e com sua bota cortuno de salto pisoteou o que sobrou dos CDS e DVDS no chão, antes girar chave para sair ainda apontou com o dedo do meio em direção aos cacos.

Sua amiga que também era linda, não vivia a razão e nem sonho, apenas vivia. Não tinha ideia nenhuma de Californicacion ou Blood Sugar Magik. Apelidara Antony Kiedis de Tonhão sempre que ouvia algum comentário sobre ele.
_Esqueça esse tal de Tonhão, lindo mesmo é o Mc Biel e, tem outra coisa, Rock é coisa do Diabo. Meu pai mesmo ficava bêbado e possuído quando ouvia um tal de Raul Seixas, quebrava tudo em casa até a coitada da minha mãe.



Já dentro do carro a amiga ligou o som no último volume, era funk ostentação e outra vez o sonho foi deixado de lado, toda empolgada Rafaela deixou-se levar pela batida, pôs a cabeça para fora do veículo em movimento e começou cantarolar acompanhando a música:



Estacionaram em frente à casa de show com a promessa da amiga:
Hoje você vai divertir à beça.
Nem bem entrou na casa de show se encantou com um rapaz que usava boné chamativo da cor verde, cheios de acessórios: correntes, anéis e alargadores. Dez minutos depois estavam de bate papos, tomando cerveja num canto da casa noturna. Ele perguntou se ela curtia funk a muito tempo. Para não passar vergonha ela disse sim e começou a rebolar sem parar, o cara achou estranho mas, dali pro motel mais próximo às coisas evoluíram rapidamente.

No carro de volta com amiga Rafaela estava em total silencio:
_E ai, me conta como foi? Pegou o cara mais popular... Esse cara vai ficar famoso MC Coppola, gravou um demo e já tem músicas tocando nas rádios...
Pouco importou-se com o comentário da amiga, Rafaela preferiu ficar em silencio até chegar em sua casa. Desceu do carro e vomitou ininterrompidamente antes mesmo de adentrar, pensou que ia morrer ali mesmo, quando finalmente terminou, sua amiga já havia sumido pela avenida. Vale lembrar que o sol já se fazia presente. Com o sinal wifi domiciliar restabelecido ela leu suas suas mensagens, uma particularmente chamou sua atenção.

"Esse é o link do novo álbum do Red Hot Chili Peppers -  The Getaway."

Ligou o computador e baixou o álbum já com o arrependimento de ter quebrado toda a discografia da banda. Pela segunda vez vomitou, agora no tapete da sala. Decidiu tomar um banho e aumentou o som para conferir o album The Getaway.
Enquanto despia-se a primeira surpresa veio juntamente com o primeiro acorde de The Getaway, marcas avermelhadas no pescoço, teve náuseas enquanto a água fria do chuveiro escorria pelo seu corpo:




That’s right, you’re right
We will do our thing tonight, alright
Take me through the future
It’s time, you’re fine
Just another color coded crime
Incision and a suture



Saiu do banheiro no ritmo da funkeada We Turn Red, balançando os cabelos ainda molhados, numa tentativa frustrada de uma dança descompassada e melancólica. Aproximou-se do espelho e continuou balançando os cabelos com mão esquerda colada no rosto, uma lágrima gélida e solitária escapou-se dos seus olhos castanhos findando no piso de tacos.




Mas, foi durante Sick Love que ela começou vestir-se, uma calcinha preta de algodão e calça de jeans, camisa preta do Chili Peppers, batom vermelho, algum pó misterioso para esconder as marcas no pescoço, nos pés tênis All Star.




Em This Ticonderoga Rafaela já sentia -se recuperada procurando cerveja na geladeira, a dança ainda era descompassada porém com os braços estendidos e as mãos abertas tateando o invisível.
Tentou em vão juntar o quebra-cabeças dos cacos da coleção do Red Hot Chili Peppers que ela mesmo havia destruído, chegou à conclusão que era irrecuperável. Levantou-se rumo a geladeira em busca de mais cerveja.




Dançou num ritmo mais lento na música The Hunter com a lata de cerveja nas mãos, olhou para o teto, o lustre e uma pequena aranha procurando por abrigo porém, uma lagartixa ligeira e faminta fez da aranha um banquete. Ouviu o celular tocar era sua amiga:



-Oi Rafaela melhorou? Cê tava mal hein?
E antes que ela pudesse responder...
-Tenho boas notícias o MC Coppola. Ele ligou perguntando de você.
Silencio.
-MC Coppola ligou perguntando de você e, você não vai dizer nada Rafaela? Ele disse me que adorou a noite... Alô? Alô?
-Foda-se Mc Coppola – Respondeu Rafaela e desligou o telefone,aumentou o volume do aparelho de som “Dreams Of A Samurai” era música da vez.



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domingo, 12 de junho de 2016

Radiohead - A Moon Shaped Pool



Radiohead - A Moon Shaped Pool
Fantasiando do mesmo jeito que te encontrei, do último cigarro, da lua cheia, do mendigo da esquina com seu cachorro magricelo, da pressa e dos discos voadores. O último trago e a fumaça passando, o cachorro latindo, a lua atrás das nuvens, o mendigo levantando. Sentávamos no meio do nada e riamos de tudo e, assim seria e seriamos, criaríamos o nosso filho na lua, no meio da fumaça da promessa do último cigarro, viveríamos como mendigos sem religião ou devoção por Maria. Poderia faltar leite mas, jamais faltaria alegria.

Andaríamos na contramão com nossas mentiras que, acreditamos piamente que fossem verdades. Do avesso acordaríamos com o sol do meio dia, barbas e pêlos misturados com a fumaça oriundo da promessa do último cigarro. O riso viria fácil com o primeiro acorde de um violão com uma corda arrebentada, teríamos a nossa política de não ter política e você seria sempre minha, fantasticamente minha....


Então, você partiu e partiu meu coração, deixou minha vida sem graça. Continuo na contramão sem amor nenhum, sem esperança e com dor no estomago. Levo sempre comigo o violão faltando uma corda, os discos voadores estão me seguindo juntamente com risos e palavras ofensivas dos transeuntes. As vezes eles me atiram pedras, cospem em minha direção, me agridem com socos e ponta pés e, me ameaçam com gasolina.
Durmo durante o dia e vago durante a noite, o silencio da noite me faz bem. Cada noite uma cidade diferente, com iluminações diferentes, com praças diferentes, monumentos diferentes, com tudo diferente, só eu que não mudo, um amontoado de feridas expostas, barbas e pêlos. A necessidade de falar, de gritar, de rir e receber o eco como respostas. Mas já tive dias melhores e, os melhores dias da minha vida era quando você estava aqui, no inverno a gente se abraçava na calçada enrolados em jornais ou cobertores doados por alguma ONG, ficávamos ali noite inteira ouvindo a respiração do outro e observando as estrelas até sumirem com a claridão.


Semana passada eu fui abduzido por um disco voador, você não vai acreditar, já era madrugada de uma densa neblina, foi quando uma luz começou aproximar, achei que fosse a lua ou até mesmo o sol e continuei com a promessa do meu último cigarro, quando me dei conta eu senti meu corpo em pleno ar, comecei a gritar e ninguém me ouvia, alguma força não sei de onde me puxava para cima em direção a luz cada vez forte e até eu me apagar por completo.
Acordei numa sala branca com latidos de cachorro, aquele mesmo cachorro magricelo que pertencia ao mendigo da esquina. O que estava fazendo ali? Eu não sei, porém, estava bem cuidado e bem alimentado. Permaneci horas ali eu e cachorro, acho que estávamos sendo observado, eu pressentia isso.
Havia músicas oriundas de pequenos alto falantes que existiam nos quatro cantos daquela sala, músicas tristes e sempre com uns barulhinhos estranhos. De repente uma das paredes tornou-se um grande telão e, para minha surpresa eu vi você caminhando lentamente por ruas que desconheço, parecia estar feliz, os cabelos tão curtos, do seu lado caminhava uma bela menininha talvez, seja sua filha, o cachorro ao meu lado começou latir em direção do telão, acho que ele te reconheceu.
De repente tudo ficou tudo escuro como se alguém apagasse as luzes e a música tornou-se mais rápida ainda que melancólica e, somente quando as luzes voltaram que eu percebi que tinha cinco elementos ao meu redor, todos olhavam fixamente em minha direção, procurei pelo cachorro no entanto, ele já não estava mais ali, senti um arrepio, queria acordar no entanto eu não estava dormindo. Então, um dos elementos aproximou-se com os cabelos desgrenhados e com um olhar estranho fico me encarando por alguns segundos, sem sorrir me entregou um pequeno embrulho... Adormeci.


... Quando acordei o sol já era do meio do dia, os transeuntes me olhavam com seus olhares de compaixão ou ódio, em minhas mãos o embrulho. Calmamente abri, era um CD com um encarte intrigante intitulado Radiohead A Moon Shaped Pool, me lembrei do disco voador, levantei-me e comecei andar sem rumo certo, do meu lado o cachorro.

Descobri recentemente que as músicas que ouvi naquela sala estão todas no CD que recebi aquele dia e que os músicos são os cinco que me encararam no disco voador...


domingo, 17 de abril de 2016

Suede - Night Thoughts


Aqui a noite é mais fria e solitária, o sono é raro e a falta de apetite não me faz mover da cama. Visitas noturnas com suas vestes brancas, fantasmas que não atravessam portas, que não voam e que não assustam. No entanto, te ferem com o lindo sorriso nos lábios, fantasmas que conversam com o seu delírio, ri, preocupam, desabavam, silenciam e vão embora sem atravessarem a porta.
Aqui pessoas morrem de verdade, do nada, de dor cabeça, de um resfriado, de uma tontura, morrem assim sem se despedir de ninguém. Eu fecho meus olhos, então, eu me vejo com asas de volta as ruas da cidade, vejo pessoas caminhando, ouço músicas do último álbum do Suede – Night Thoughts, vejo estrelas brilhando no céu, sinto respingos d’água do chafariz da praça, vejo meus amigos mas, eles não conseguem me ver. Eu voo lentamente sem pressa nenhuma, no entanto, eu sinto uma dor aguda em minha asa esquerda, carros, ônibus, motos, bicicletas e transeuntes faz a cidade movimentar. Luzes dos apartamentos, luzes dos postes, das estrelas, da lua, eu vejo luzes em todos lugares. Novamente a dor aguda me incomoda, bares, botecos, lanchonetes e pizzarias. Procuro por você em todos os lugares possíveis, brigo, discuto, xingo, enfezo com minhas incertezas. Mas, a dor aguda em minha asa esquerda faz tudo isso desaparecer, e um fantasma que não voa diz:
_ Tivemos que trocar o acesso do soro para seu braço esquerdo.
Injeção para febre, para estomago, para dor, para o fígado... Aqui a noite é mais fria e solitária.



Não sei bem o motivo mais me lembrei de toda discografia do Suede, e vi o próprio Brett Anderson dançando no corredor do hospital, médicos, enfermeiras, faxineiras, pacientes acompanhavam naquela dança frenética. Tentei me levantar da cama empolgado com tudo aquilo acontecendo, comecei a cantar em pleno pulmões até ouvir uma voz:



_ Ele está com febre alta outra vez.
Injeção para febre, para estomago, para dor, para o fígado...
A cama do meu lado amanheceu vazia, ele tinha apenas uma dor cabeça e faleceu. Tenho febre, dores, calafrios, diarreia, indisposição, urina escura...
 _Acho que vou morrer - Digo para enfermeira, ela ri e responde:
 _Você pensa que morrer é fácil?
 Então eu penso “Ele só tinha dor de cabeça”.
Durante o dia com a janela aberta vejo pombos no telhado, nuvens brancas no céu, um avião distante e silencioso. Ouço barulho de carros, de pardais e a cama vazia do meu lado, ele tinha apenas dor cabeça.



_ Oi.
Era médica que acabara de chegar, sempre com o aquele sorriso que não significava nada, sempre com aquele olhar complacente que também significava nada. Você poderia estar resfriado, com dor peito, câncer ou amputado uma perna que o sorriso e o olhar dela ainda assim seriam o mesmo.
_Tá ouvindo o quê? _ Indagou ela reparando o fone em meu ouvido.
_O novo álbum Suede – Respondi olhando para os pombos, observando que o avião já não fazia parte da minha visão.
_The London Suede – Ela respondeu.
Olhei rapidamente para sua direção e outra vez, aquele sorriso que não significava nada.
Ela continuou:
_Morei na Inglaterra nos anos noventa e o Britpop estava alta, Suede era minha banda favorita. O Brett Anderson meu deus!!! – Ela olhou em minha direção com aquele olhar que não significava nada e, complementou: _ O Brett Anderson era tudo.



Não sei bem o motivo porém, comecei a falar seriamente do que ocorrei na noite passada:
_Doutora o Brett Anderson esteve aqui ontem a noite, e, você sabe disso, fez todo mundo dançar pelo corredor afora. Desculpe me, mas nunca vi uma pessoa dançar também como a senhora.
Ela rapidamente chamou enfermeira sorrindo e me encarando, o que não significava nada. Não havia mais pombos no telhado e nem nuvens brancas no céu. Sua voz era pastosa e quase inaudível. Disse ela que minha febre estava alta, altíssima ao ponto de delirar, de ver o que não se enxerga, de ouvir o que não foi dito.
_Paracetamol na veia – Recomendou para enfermeira que acabara de entrar no quarto.
 Sinto dores em minhas pernas, dores insuportáveis mesmo imóvel. Tenho um novo vizinho na cama ao lado, só trocaram os lençóis. Acidente de moto, tão novo o rapaz, não mais que vinte anos. Ouvi alguém dizer enquanto eu contorcia de dores que, ele estava com uma sonda para alimentar.  Suores frios transitavam pelo meu corpo inteiro, ouvi alguém dizer que ele perdeu parte do pâncreas. Recoloquei o fone no ouvido e, não ouvi ninguém dizer mais nada.
 Adormeci um longo período e acordei, só que meus olhos enxergavam apenas escuridão. Nenhuma luz emergia por mais que forçasse minha visão e no meio dessa treva, ouvi alguém dizer que ele tinha dores musculares e febre alta, que o batimento cardíaco estava normal, e a pressão normal que, era uma pena perder um paciente assim, tão de repente. Pensei comigo na escuridão meu Deus tão novo. Amaldiçoei em pensamentos aquela cama que ficava do meu lado direito perto da janela. Duas mortes em menos de vinte quatro horas. Foi quando eu ouvi alguém dizer que o mocinho perto da janela estava reagindo bem aos medicamentos.
Como assim? O quarto com têm duas camas, o mocinho perto da janela estava reagindo bem aos medicamentos. Eu não sou mocinho e a minha cama não fica perto da janela.
Tentei chamar enfermeira com desesperado porém, minha voz não saia, a escuridão permanecia, não sentia mais dores nas pernas, sentia apenas que meu corpo flutuava e a música do Suede ainda continuava alta.




Que estranho, quando tinha dezoito anos de idade vislumbrava com a morte, agora com quarenta três eu não posso estar morto: esposa, filhos, neta, amigos, truco no boteco, fotografias e a tão sonhada volta do The Smiths...
The Furs & The Feathers é última música do novo álbum do Suede que foi interrompida bruscamente.
_Desculpe acordar você assim. Mas, é só puxando o fone do seu ouvido para acordar você.
Meus olhos saíram da escuridão e, eu nunca fiquei tão feliz de testemunhar aquele sorriso que não significava nada. Era a doutora com cabelos soltos que esvoaçam com o vento que entrava pelo um pequeno vão da janela aberta. Ela disse:
 _Tenho algumas novidades para você.
_Diga - Respondi ainda aliviado de tudo ter sido um sonho.
_A primeira coisa é que seus exames deram tudo negativo. Dengue, Leptospirose, Hepatite A. Enfim...
_E?
- Que não sabemos qual é o vírus ainda.
Criou-se um silencio que o pingo do soro ficou audível. Pensativa, pausadamente e preocupada com cabelos ela continuou:
_Continuaremos com os remédios para controlar a febre e o soro para hidratar e, tente alimentar direito. Sei que a refeição aqui não é uma das melhores mas, com certeza tem tudo o que você precisa.
No entanto, somente quando ela abriu a porta para ir embora que ela virou se e disse:
_Roberval esqueça o The Smiths jamais retornará.



segunda-feira, 8 de fevereiro de 2016

Joy Division - Closer




Pare o carro, puxe o freio de mão, desligue os faróis mas, não desligue o rádio. Aliás, aumente no volume máximo essa é a primeira faixa do álbum Closer do Joy Division chamada Atrocity Exhibition. Você se lembra dessa música? Com certeza lembra... Pausa antes de começar a segunda música. Eu poderia acabar com você agora.



 Agora saia do carro. Você se recorda daquela arvore? Um ipê amarelo todo florido em sua frente. Vamos até lá. Observe que o vento arranca algumas flores do ipê igual a primeira vez que estivemos aqui. Você se lembra dos diálogos que tivemos? É bem diferente de hoje. Pois hoje, só eu que falo. Enxugue suas lágrimas, tardias elas não têm nenhum significado, nem mesmo com os raios do sol elas não brilham... Eu poderia acabar com você agora.

Isolation (tradução)

Mãe, eu tentei, por favor, acredite em mim,
Estou fazendo o melhor que posso.
Me envergonha as coisas que tenho feito,
Me envergonha a pessoa que sou.

Voltaremos para carro e ouviremos a segunda música Isolation, depois rumo ao centro da cidade vizinha, desceremos na choperia porém, antes ouviremos Passover e, eu te peço, não faça nenhum movimento brusco ou tente fugir, eu não tenho nada perder e, você sabe disso. 



Pedirá dois chopes e brindaremos possuídos de uma felicidade inexistente. Então você tocará em meu rosto suavemente até tocar os meus cabelos, fará um círculo incompleto em minha orelha e, passará o dedo trêmulo em meus lábios no entanto, não me beijará com a certeza que eu... Eu poderia acabar com você.
Retornaremos ao carro, Heart And Soul ouviremos no estacionamento em silencio, não olhe nem por segundo em minha direção apenas ouça a melodia e, que sua barba não cresça nenhum centímetro se quer, e seus dedos não tamborile a percussão da música no volante e, sua respiração continue sincronizada. Que a música penetre em seu ouvido, fazendo te arrepiar e te leve para aquele lugar onde os olhares curiosos, ávidos e sem direção enxergam um mundo colorido de ilusão, mascarando assim o inferno de suplicas e lamentações.


Instintos que ainda podem nos trair,
uma jornada que leva até o sol,
Desalmado e inclinado à destruição,
Um conflito entre o certo e o errado.
Assuma você o meu lugar no confronto final,
Eu observarei com um olhar cheio de pena,
Humildemente invocarei o perdão,
Um pedido muito além de você e de mim...

Eu estive numa clínica, eu estive com olhos pregados em uma vidraça durante a chuva, eu tive medo de ir embora porem, ficar estava me matando. Das alternativas a fumaça do meu cigarro apontou a direção da fuga, planejei durante semanas fumando cigarros da mesma marca, sentado no mesmo lugar. Fugi para onde a fumaça apontava a direção. Fugi de mim mesma, desesperada, alucinada, ouvindo Twenty Four Hours. Sob um céu sem estrelas, sem lua, encoberto por densas nuvens escuras, relâmpagos, trovoes e granizos. Então eu parei, respirei debaixo de uma gigantesca arvore, acendi outro cigarro da mesma marca esperando que fumaça me guiasse, porém um raio violento me fez jogar o cigarro e rolei ribanceira abaixo. A fumaça dissipou e outra vez eu fiquei perdida. Eu não quero que você se comova com isso pois, eu poderia acabar com você agora.



Acelere, rápido, acelere quero novamente sentir o vento, o perigo, a música, o movimento, quero que o meu pensamento balance, quero que meus olhos não se percam no risco continuo dessa cerca de arame farpado ao redor, acelere até que minhas lembranças me façam sangrar novamente, me traga o ritual dos inválidos e que surja Rose com seus dentes podres e unhas sujas e me abrace fortemente e diga-me “Desta vida a única certeza que temos é a morte”. E, Rose morreu no dia seguinte estuprada e com a cabeça aberta por uma barra de ferro.

Agora pare, freia bruscamente já estamos na última música "Decades", a hora que você tem descer do carro, a hora que se reza para um Deus que a sua fé sempre renegou, não olhe para trás não quero que minhas lágrimas encontrem com as suas, lágrimas que seguem o mesmo caminho no entanto, de sentimentos opostos. Quero que saiba que você foi meu único amor, vivi intensamente tudo isso, meus melhores dias, minha alegria fora de controle, meu jardim florido e noites de estrelas. Saiba, eu morri quando fui traída, nada mais disso me importa, eu não me importo mais se alegria foi embora e as flores estão mortas. Saiba você que Rose com seus dentes podres e suas unhas sujas tinha razão... Você também morre no final.



Cansados por dentro, agora nossos corações perdidos para sempre
Não podemos nos recompor do medo ou da ânsia da perseguição
Estes rituais nos mostraram a porta para nossas caminhadas sem rumo
Aberta e fechada, e então batida na nossa cara.
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