terça-feira, 5 de setembro de 2017

Elvis Presley - A Caixa Vermelha de Elvis.



Porque nossa conversa começava depois que todos estavam dormindo, não tínhamos sonhos, só insônias e, eram as melhores insônias de todos os tempos. Eu me lembro que ia trabalhar no dia seguinte cansado, bebia café como se fosse água, dormia em pé porém feliz. 

Felicidade transparece até mesmo com olheiras gigantescas, não produzia como devia e o chefe que era um grande amigo percebia o meu sono, o meu cansaço mas, acima de tudo testemunhava minha felicidade e, dizia sempre “Vai lavar o rosto no banheiro eu termino isso pra você”.

Um dia eu estava tão bêbado que em plena madrugada, de uma insônia solitária pois, havíamos desentendidos um dia antes, eu levantei da cama e pichei o nome dela no muro da minha própria casa, voltei para cama, a insônia continuou a me perturbar, iriam descobrir que fui eu mesmo que escrevi. Eu, levantei novamente e, fui para o quartinho das ferramentas, misturei algumas tintas e peguei a brocha e, em plena madrugada fria de inverno comecei a pintar o muro inteiro, o guarda noturno em sua bicicleta me cumprimentou assustado depois, soletrou o nome dela muro:

_E-V-E-L-Y-N

Certa vez eu presenciei ela com o marido de mãos dadas conversando e sorrindo, ela parecia bem feliz, comecei a segui-los numa distância bastante segura, ele entrou no Banco e ela ficou do lado de fora. Resolvi ligar para celular dela e, no momento que ela olhou para o celular percebi mesmo que de longe seu nervosismo.

_Alô? Sua voz estava tensa.
_Oi Evelyn – Tentei disfarçar minha decepção, continuei:_ Onde você está?
_Estou trabalhando.
_Trabalhando? Hoje não é seu dia de folga?
_É, mas me chamaram para trabalhar – Avistei o seu marido saindo do banco:_ Tchau vou ter que desligar agora.

Nem deu tempo de responder o tchau apenas, testemunhei o seu marido tentando pegar o celular da mão dela, ela recuou, discutiram e voltaram a caminhar novamente sem as mãos dadas, sem conversas e sem sorrisos.
Nesse dia fui trabalhar nervoso, não conseguia concentrar no que estava fazendo, errei a medida de um material que era exportação urgente e, jamais tinha testemunhado meu chefe tão nervoso comigo:

_Porra cara, assim você me fode. Cacete. O que está acontecendo com você? Assim não dá...
Sai da fábrica totalmente pirado, pensamentos inconclusivos, respiração ofegante, velocidade máxima.

“O que está acontecendo com você?”

Cheguei em casa com uma vontade louca de fazer sexo e, quando eu toquei em minha esposa as palavras rotineiras:

_Sai pra lá. Eu tô dormindo, tenho que levantar amanhã cedo – Ela sempre dizia isso mas, aquele dia eu estava totalmente fora de si, fizemos sexo de forma tão selvagem que, com certeza não foi amor. Ela se levantou da cama ainda nua, enquanto eu acendia o cigarro. Indagou-me:
_Você está bem, mor?
_Estou. Por que não estaria?
_Pois, você errou meu nome duas vezes antes de ejacular.

Minha esposa me beijou toda feliz que, nem me questionou sobre o nome e, eu que fiquei curioso pra saber que nome eu tinha sussurrado, tudo indicava que era Evelyn, pois Evelyn estava em tudo e em todos lugares, com sorrisos e olhares ela foi penetrando em minha vida, até lugares que eu achava seguros, por exemplo o meu casamento:
De repente eu comecei achar que o meu casamento já era tão seguro assim pois, Evelyn fazia coisas diferentes, me escutava e interessava também sobre meus gostos e, quando eu tocava em Evelyn ela não tinha dor de cabeça, não tinha de acordar cedo. Na verdade, não foi o jeito de fazer sexo de Evelyn que afundou meu casamento. O que afundou meu casamento foi jeito que Evelyn me dava atenção. Mas, ainda sim, o que me tirava do sério era só de pensar o jeito que ela fazia sexo comigo, ela poderia fazer do mesmo jeito com o marido dela e, fazer sexo com o marido dela pra mim já era uma traição e, algumas vezes eu teclava na madrugada com ela:

_Você fez sexo com seu marido?
_Fiz, afinal ele ainda é meu marido.
_Mas, você fez da mesma maneira que você faz comigo?
_Da mesma maneira mas, com outros sentimentos.
_Não acredito, é traição Evelyn.
_Não é traição. Traição é que nós fazemos.
_Mas, da mesma maneira é traição da traição.
_Desencana, você faz sexo também com sua esposa, não faz?
_Mas, é diferente ela é minha esposa.
_E ele é meu marido.

Alguns dias depois encontrei o marido dela num bar no centro da cidade. Ele não me conhecia, talvez nem tinha ouvido falar o meu nome, ele estava sozinho no canto do balcão tomando cerveja, fiquei do lado oposto, encarando-o, estava bem vestido, barba feita, parecia um gerente de banco. O que Evelyn viu em mim eu não sei, barbudo, uma camiseta surrada do Ramones, calça jeans com mais de três anos de uso, carro popular de 2008 e com dinheiro contado para três cervejas.



 Meu Deus, acho que observei demais, ele acenou pra mim, disfarcei olhando para trás, fazendo de conta que não era pra mim, não adiantou ele insistiu me chamando com gestos. E, se ele soubesse de alguma coisa? Fiz aula de judô durante um mês quando tinha oito de idade talvez, agora com quarenta e dois anos, eu tivesse que colocar em pratica todo ensinamento do mestre Gerson, falecido Gerson. Lembrei das aulas de catecismo também, das orações que a catequista Delma ensinava.
A cada passo que eu dava na direção dele do outro lado balcão, embaralhava Ave Maria com Pai Nosso porém, sempre acabava num amém.
Nem bem aproximei-se dele, já foi esticando os braços e sorrindo em minha direção.

_Prazer meu nome é Carlos, eu vi você ali sozinho e, eu estou afim de conversar com alguém, logo vi a camiseta do Ramones. Sei lá, achei que poderia desenvolver um bom papo.
Evelyn nunca tinha falado o gosto musical de Carlos aliás, o gosto musical de Evelyn era horrível no meu conceito, o mais perto do Rock que ela ouvia era o Kid Abelha, uma noite depois que fizemos sexo apressado dentro do carro ela começou a cantar uma música da Ivete Sangalo:

_Pegou me deu um laço, Dançou bem no compasso, De prazer levantou poeira. Poeira Poeira Poeira Levantou poeira!

_Que isso Evelyn?
_Tô feliz ora bolas!!! Quando você está feliz você não canta?
_Canto mas, não Ivete Sangalo.
_Que música você canta então?
Então eu comecei:
_I don’t have to sell my soul
He’s already in me
I don’t need to sell my soul
He’s already in me

I wanna be adored
I wanna be adored

_Que música é essa?
­_The Stones Roses “I wanna Be adored”.
_Nunca ouvi falar mais grava pra mim, eu com certeza vou adorar.


Foi assim que aos poucos fui mudando o gosto musical de Evelyn, até chegar uma noite com mesma pressa, no mesmo carro, fizemos sexo. Evelyn colocou a calcinha vagarosamente e começou a cantar:

_I Wanna Be adored. I wanna Be adored.

Conversei com Carlos o marido de Evelyn por mais de três horas, lógico que ele nem suspeitava que eu saia com sua esposa e, nenhum momento ele falou da sua vida pessoal, rimos muito falando de nossa adolescência, descobri que ele era fanático pelo Elvis Presley que, até arriscou no auge da bebedeira “Suspicious Mind”, fazendo do copo que ele tomava cerveja um microfone improvisado, e pelo grau da bebedeira eu cheguei imaginar que estava perto do Elvis de verdade até ouvir o barulho de descarga, um senhorzinho calvo acabava de sair do banheiro.


Teve um hora que eu fiquei preocupado com o numero cervejas que tínhamos bebido, eu tinha dinheiro apenas para três porém, Carlos me abraçava e dizia “Meu, eu precisava de um cara assim pra conversar, eu tenho pouca fé no entanto, tenho certeza que foi Deus que te enviou aqui”. Lógico que, por mais bebida que eu tivesse ingerido, eu estava bem mais lucido do que Carlos, tinha plena consciência que Deus jamais enviaria o amante da sua esposa em bar cheio de cervejas.
No caminho de volta para a casa eu estava sentindo uma coisa estranha, o pôr do sol, o ipê amarelo florido, os pedintes nas esquinas, tudo tinha um pouco de melancolia para os meus olhos. As pessoas estavam tristes e cansadas dependuradas nos ônibus, o guarda de transito gesticulava com rapidez porém, seus olhos estavam vazios, nas esquinas jovens bonitos todos tragando cigarros de maconha, um cachorro magricelo e sarnento revirava o lixo procurando alimento.


Na minha mente Carlos, o legal, o sorridente, conhecedor de livros, de filmes, de política, muito mais inteligente do que eu. Comecei a andar vagarosamente na cidade, reparar detalhes que sempre passaram sem jamais chamar minha atenção, pardais nos telhados das casas, o badalar dos sinos na igreja, esculturas que jamais tinha visto no alto do Museu.
Eu me senti tão mal que vomitei numa lixeira, pensei até que ia morrer, o vomito saia até pelo nariz. Comecei enxergar naquele momento uma Evelyn diferente de todas Evelyn (s) existentes, até a lua que já fazia presente era diferente de todas as luas que eu e Evelyn passamos juntos e abraçados observando. Ela não estava tão brilhante, pensei algumas vezes que ela ia se apagar, não apagou-se no entanto, sumiu-se por alguns demorados minutos, uma nuvem carregada ofuscou seu brilho.

De repente comecei a desconfiar de todas as mulheres que eu encontrava na Rua, imaginando que estivesse saindo de algum motel, que tivesse acabado de copular com outra pessoa. Mulheres apressadas, outras nem tanto, algumas arrumavam os cabelos, outras reforçavam a camada frugal do batom, sérias, felizes, bonitas e feias. Uma loira que vinha na minha direção toda fogosa me chamou de “tarado” e, eu com todo pensamentos girando em minha cabeça respondi chamando-a de piranha.
Cheguei em casa e Ana Paula minha esposa estava toda arrumada, perfumada, batom vermelho, salto alto.

_Ainda bem que você chegou, esqueceu que eu falei que ia no Shopping trocar o vestindo que ganhei de aniversário.
Aproximou-se:
 _Nossa que cheiro horrível “mor” pelo jeito você bebeu mais do que devia.

Todas aquelas imagens das mulheres arrumando os cabelos, reforçando a camada frugal do batom, das sérias, das felizes, das bonitas e das feias vieram novamente em meus pensamentos.

_Você não vai no Shopping? Eu sei aonde você vai sua vadia – Falei com tanto ódio.

Ana Paula se assustou com tamanha braveza das minhas palavras.

_Que isso amor? “Cê” tá bem?
_É vadia mesmo, é igual Evelyn e todas que estão na rua nesse momento.
_”Mor” quem é Evelyn? Foi de Evelyn que você me chamou aquele dia.
_ O que importa agora quem é Evelyn? São todas vadias.


Nunca mais vi Ana Paula, nunca mais vi Evelyn, nunca mais vi mais ninguém. Fiquei sozinho em casa durante meses ouvindo todos os dias uma caixa com cinco álbuns (vinil) que tinha como preciosidade do Elvis Presley.

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