sábado, 8 de dezembro de 2012

Bob Dylan - Desire



Bob Dylan - Desire
Esta eu dedico a você gordo, arrogante e desgraçado
Gosto do contratempo, da chuva que me empurra para
 bares desconhecidos, de pessoas desconhecidas com guarda-chuvas coloridos, do raio que ilumina o céu escuro, dos siriris suicidas que levantam voos. Gosto das tardes sem sol ou, das tardes com o sol interrompido por uma tempestade apocalíptica que, arranca galhos e telhas, que inunda ruas e derruba pontes.
Entro no primeiro boteco que encontro, ajeito o fone no ouvido: Bob Dylan – Desire ou Bob Dylan - Highway 61 Revisited... Sempre persiste minha duvida.

Engraçado só de pensar que esse cara com a voz esganiçada um dia seria um cantor de rock. Imagino o pequeno e frágil Dylan:

_Papai quero ser cantor?

_Cantor Dylan?

_Isso Papai... Quero ser um grande cantor.

_Dylan, médico não seria melhor?

_Não Papai quero ser cantor.

_Talvez advogado, dentista ou engenheiro?

_Não Papai, eu quero ser cantor.

_ Dylan, mas sua voz...

_Tem algum problema com minha voz Papai?

_Não filho. Não há problema em sua voz...


Hoje vou ouvir Desire.



Acendo um cigarro e aceno para o desiludido de cabelo grisalho e com grandes olheiras. No arrastar lento de suas havaianas ele aproxima, não há duvida nenhuma que seu estabelecimento está falido e o pior, sua vida tá pior ainda. Talvez corno ou talvez trouxa. Quem saiba um puritano, desdentado e dizimista.

-Uma cerveja...

Só então observo uma garota com uma micro saia solitária que retribui o meu aceno com um sorriso vazio que, não expressa sentimento algum, porém é fácil notar que suas pregas ardem e o desconforto de suas pernas cruzadas mostram que prazer também tem seu preço.

Bob Dylan rolando...

_Outra cerveja amigo?

Questiona o corno, trouxa ou sei lá.

_Outra.

Só então reparo que no corredor que dá acesso ao banheiro tem um homem gordo e alto. Que me encara indiscretamente.
Sorrio. Porém o meu sorriso  não é aceito, uma recusa desconfortável. No entanto estou ouvindo Bob Dylan que me conforta mesmo sabendo que sua voz não é confortável. Uma mosca tenta dezenas de vezes mergulhar no meu copo de cerveja.

Mas Dylan eu também tenho historias. Alias, elas me perseguem o tempo todo, elas se atiram em mim implorando “Escreva-me, escreva-me”. Afundo minha cabeça entre meus braços sobre o balcão, de olhos fechados e a respiração profunda. 

_Outra amigo?

_Outra, outra, outra, etcetara de outras.

Em “Romance In Durango”, eu me levanto.
O homem gordo, o corredor e o banheiro. Era para ser simples assim se minha visão não triplicassem tudo e Dylan não ficassem ecoando em meus ouvidos:



No llores, mi querida
Nao chore, minha querida
Dios nos vigila
Deus nos vigia
Soon the horse will take us to Durango.
Logo o cavalo nos levara a Durango
Agarrame, mi vida
Me abraca, meu amor
Soon the desert will be gone
O deserto logo acaba
Soon you will be dancing the fandango.
Logo você vai estar dançando um fandango


Ziguezagueando e apoiando no balcão consigo dar os primeiros passos, mais dois passos, fico em frente do homem gordo. Sorrio porém, o meu sorriso não possui o efeito da bandeira branca da paz.
Sou agredido enquanto sorria amistosamente para agressor, socos repetidos e fortes direcionado sempre em minha cabeça. De repente ouço a loira de minissaia agarrando o agressor e falando grosso.

_Larga dele seu frustrado filho da puta. Larga dele seu broxa.

Mesmo levando uma direita direta no rosto compreendi que a loira era baita de um traveco.

_Fredy – Grita o velho desdentado.

Fredy era o nome do traveco que me arrastou para o canto me separando da zona combate, ou melhor, de massacre. Não sei bem motivo mas, com certeza não foi homofobia que fez desferir uma dentada tão forte no braço do traveco que quase arranquei pedaços.
Foi então a vez do traveco a me golpear com chutes socos e até uma voadora. Cai na calçada, a chuva ainda caia fria diferentemente do sangue quente que escorria do meu nariz.
Apoiando-me no poste consegui me levantar, pensei no meu filhinho de três anos e comecei a caminhar no sentido contrario da chuva e, Bob Dylan ainda sussurrava em meu ouvido.

Sara, Sara,
Sara, Sara,
Whatever made you want to change your mind?
O que foi que fez voce mudar sua mente?
Sara, Sara,
Sara, Sara,
So easy to look at, so hard to define.
Tão fácil de contemplar, tão dificil de definir.





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