David Bowie – The Rise & Fall of Ziggy Stardust and Spiders From Mars
Meu
primeiro contanto profundo com a música do David Bowie veio acontecer no começo
dos anos 90 com mudança de um novo vizinho. Um homem de meia idade, recatado e
bem vestido. Estas foram as primeiras impressões que tive do novo vizinho pela
fresta da janela da sala da minha casa, por onde pude observar o dono daquela
casa nova e aconchegante. Outra coisa que observei que não havia mulher,
criança ou cachorro. Fui dormir...
Acordei
sete horas da manhã do Domingo com uma música alta, era o novo vizinho marcando
seu território ou coisa parecida. A música era boa porém, não identifiquei quem
era o cantor ou banda. Sai ainda de cueca para o quintal encucado, não era
Grunge e nem Britpop, sendo que a segunda opção parecia oriunda daquilo que eu
estava ouvindo. Certeza mesmo é que tinha sido gravado antes dos anos oitenta.
Meu novo vizinho também tinha um bom gosto musical.
Fui
para cozinha com a intenção de fazer um café no entanto, descobri finalmente
quem era o dono daquela voz, era David Bowie. Starman foi a música que fez as ligações
em meu cérebro... Putz, eu sabia que já tinha ouvido aquela voz.
Adiei o café, abri uma cerveja e aproximei do muro afim de ouvir o álbum
completo.
Demorou
talvez duas semanas para fazermos amizade e, fui eu, que puxei assunto:
_Você
gosta muito do David Bowie?
_Nossa!
Devo tê-lo incomodado.
_Que
nada, pior seria se fosse como vizinho da esquerda aqui, só rola Raça Negra o
dia inteiro.
_Cruzes!!!
Odeio pagode. Que sorte é a minha, que sua casa é um paredão para
meus ouvidos. – Ele sorriu coçando a nuca, depois me questionou: _ E você? Além
do David Bowie o que mais ouve?
_Na
verdade tô aprendendo ouvir Bowie depois que você mudou pra cá. Ouço:
Nirvana, Pixies, Alicie In Chains. Quem mais? Enfim bandas inglesas: Manic
Street Preachers, The London Suede, The Stones Roses. Não sei se voce conhece?
_
Conheço sim. Mas devo confessar, eu amo Bowie.
Ele
poderia realmente conhecer todas essas bandas que citei entretanto, o que mais
eu ouvia do lado de cá do muro era David Bowie principalmente o álbum: The Rise
and Fall of Ziggy Stardust and Spiders From Mars. Outra coisa que notei que sempre no final de
semana apareciam alguns rapazes em sua casa, e, embalados ao som de David Bowie ouvia-se um coro desafinado.
Alguns anos depois o meu vizinho começou a construir uma edícula e não
demorou muito para ficar pronta. Convidou-me para conhecer, advinha o que estava
tocando no aparelho de som? Creio que muitos acertaram o vinil do David Bowie
The rise and fall of ziggy stardust and Spiders From Mars. Cozinha, sala, banheiro e um
dormitório:
_Meu irmão vai vir morar na casa da frente... Coitado está sem moradia. Ele,
a mulher, duas crianças e um cachorro. Vai morar aqui temporariamente até
estabilizar, conseguir financiar uma casa além do mais, eu adoro meus
sobrinhos, são uns amores.
Já estava de saída quando ele disse:
_Espere um pouco.
Voltou para sala da edícula e trouxe com ele o vinil do David Bowie que
estava tocando no aparelho de som.
_Toma, é para você de presente.
_Nossa, não precisa. Você ouve todos dias.
_Eu tenho outro desse. Esse é seu.
Depois da mudança do seu irmão para casa da frente, Benedito tornou-se mais
dócil e comunicativo. Ele tinha um afeto grande pelos sobrinhos, dois moleques
com idade de oito e seis anos que, rapidamente aprenderam a cantar músicas do
David Bowie. No entanto, a noite não tinha mais aquela empolgação o som era
baixo, as conversas terminavam antes da meia noite. Um dia resolvi eu mesmo
ouvir aquele vinil do Bowie que havia ganho dele de presente no volume máximo
depois da meia noite, achando estar fazendo um bem para os ouvidos dele.
Resultado, vinte minutos depois a viatura da polícia estava em frente da minha casa.
No dia seguinte Benedito veio conversar comigo:
_Desculpe pela polícia ontem à noite. Meu irmão... Eu já conversei com
ele...
_Tudo bem. Acho que extravasei mesmo, esqueci das crianças.
Porém, o pior estava por vir, foi num sábado quando Benedito resolveu
fazer um revival das noites festivas com os seus amigos jovens em sua casa, a
primeira coisa que percebi que o som estava alto, havia risos e um falatório interminável,
o som era David Bowie The rise... Do outro lado do muro eu estava feliz e
sonolento. Confesso que dormi um pouco, fui acordado com uma gritaria
gigantesca. Era discussão entre Benedito e seu irmão:
_Que isso Bendito isto aqui já extrapolou todos os limites, som alto,
bebedeira e está pouca vergonha de orgia.
_A casa é minha.
_Mas, você acha certo fazer sexo grupal com as portas e janelas abertas?
Eu tenho filhos pequenos, seus sobrinhos alias. Você é meu irmão.
Foi ai que Benedito perdeu as estribeiras:
_Irmão porra nenhuma... Sou sua irmã. Aceita isso ou vai embora.
_Tio, tio, tio – era as vozes dos sobrinhos.
_Tio não, Tio o “caraio”. Tia, de agora em diante é tia.
Acordei tarde naquele dia e descobri que já não tinha mais vizinho. Mudaram-se
logo de manhã daquele domingo. Nunca mais vi Benedito ou seus sobrinhos, na
verdade a única que coisa que sobrou desse tempo foi o vinil do David Bowie.
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