Diná, a empregada foi embora as dezesseis horas, olhou-me
tristemente antes de fechar portão. Aliás, ela chutou a bola com força para bem
longe, estava apressada e com medo do temporal, sem guarda-chuva e com um vestido
com tecido fino, ficou envergonhada quando uma rajada de vento deixou visível
sua calcinha vermelha minúscula. Porém, eu estava tão triste que nem observei
algumas estrias do lado direito da sua bunda bem branquela.
Sinto falta do latido do cachorro que tanto me irritava, do miado do gato preguiçoso e folgado, do meu
filho pequenino brincando com os carrinhos na varanda. Sinto falta de você,
sinto falta da sua voz e do seu perfume, apesar que, a empregada Diná passou
usar o mesmo perfume que você usava.
Saiba, que toda felicidade que você me trouxe, você levou
embora mas, levou bem mais do que trouxe, levou sonhos, sentimentos, minha
geladeira, meu fogão, meu carro e o pior de tudo isso, minha coleção de álbuns do The
Smiths.
Sorte minha que a empregada Diná me presenteou com a mesma coleção do
The Smiths e, com mais algumas raridades.
Lá fora cai uma chuva fina e fria. Observo daqui da janela
um pardal que tenta se esconder entre as folhas da goiabeira. Em vão, gotículas
da chuva escorrem entre suas penas. Meu Deus! Por que será que observo esses
pequenos detalhes das coisas? E esses pequenos detalhes me fazem por alguns
minutos esquecer de tudo e, eu não queria esquecer.Reluto em acreditar que
algum dia você não será mais nada pra mim. Porém, a empregada Diná me disse dias atrás a mesma coisa, olhando fixamente para os meus olhos sem piscar e, acrescentou ainda “Daqui
alguns anos vocês serão estranhos para o outro, não haverá cumprimentos, nem
olhares, nenhum tipo de sentimento, o passado será enterrado numa terra
inóspita, o amor será ceifado, não haverá nenhum tipo de lembrança porém, eu
ainda estarei ainda aqui”.
O sorriso sumiu dos
meus lábios,ressecados eles viraram rodovias
para fumaça do meu cigarro, sem poesia ou relatos. Meus lábios moradias de
herpes, feridas e da língua umedecida e esbranquiçada. Os olhos sem brilho, invadido por uma
ceratocone avançada, vermelhos e inchados pela insônia, nem parece os mesmos
olhos que se encantavam com a leitura de Henry Miller, que emocionava com a
paisagem do Rio que corta a cidade, do pôr do sol alaranjado do outono... Meus
olhos rios de lagrimas frias, oriundas por sentimentos mortos, da saudade feito
ferrugem que corroem o que existiu.
Recordações que me causam febre e uma alergia
que me faz coçar o corpo inteiro até sangrar, com minhas unhas carcomidas pelos
dentes obturados. Diná me traz uma toalha úmida para me aliviar da coceira, enxuga
minhas lagrimas frias, recita minhas velhas poesias, dança feito Morrissey com
jeans rasgado e um buquê de flores nas mãos.
Digo a Diná que meu amor me deixou na hora mais escura da noite,
que me deixou o silencio mais perturbador da casa, que me deixou a pior insônia de todas as insônias, me deixou.
O silencio de Diná é diferente, ele me aquece,
é o fogo com lenhas secas e estrepitas... Ela me diz “Você tem que se alimentar
e fazer barba” e, eu adormeço rapidamente com o efeito do remédio.
No entanto, depois que Diná foi embora hoje apressada por causa do temporal, eu não tomei o medicamento e decidi sair. Peguei o guarda-chuva, e,
aventurei-me pelas ruas da cidade, trovoes faziam parte da trilha sonora, no ponto de ônibus um amontoado de pessoas agasalhadas tentando
se protegerem da chuva, logo a frente um cachorro corajoso e esfomeado, pouco se
importava, fuçando o lixo em busca de alimento. O vento forte levou consigo o
meu guarda-chuva para bem longe, minhas lágrimas quentes misturaram-se com os
pingos da chuva fria, acho que estava febril...
Eu não queria esquecer de você nenhum segundo se quer. No entanto, tudo foge do meu controle até o guarda-chuva que o vento não para de soprar e, tudo está sendo rápido demais, até minha respiração, a pulsação, a pressão,a decepção,a ilusão,a solidão e outros “ãos”.
Eu não queria esquecer de você nenhum segundo se quer. No entanto, tudo foge do meu controle até o guarda-chuva que o vento não para de soprar e, tudo está sendo rápido demais, até minha respiração, a pulsação, a pressão,a decepção,a ilusão,a solidão e outros “ãos”.
Pensei de novo, não. Sem nenhuma chance, o
coração começou a bater mais forte, a fragrância do mesmo perfume oriunda do meu quarto
causou uma ereção involuntária. Trêmulo e com o coração a mil toquei o interruptor, assim eu
pude testemunhar, o mesmo modelo de calcinha, só que agora a cor era diferente,
preta. No entanto as mesmas estrias, a mesma bunda branquela, com as mesmas estrias do
lado direito. Eu já estava pronto, ela já estava pronta e o The Smiths era
trilha sonora...
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